Seus olhos diziam claramente aquilo que os poetas tentam, muitas vezes em vão, dizer com palavras. Mas há muito as pessoas perderam a capacidade de 'ouvir' um olhar. Assim como perderam a sensibilidade para receber um gesto de amor, mesmo os mais puros, aqueles que só fazem mal quando ignorados. Já passara da fase de tentar entender, quando ficava imaginando o que se passava na cabeça daqueles que abraçava como quem abraça a vida. E para ele, era como se dissessem "tá, você gosta de mim, já percebi, mas essa é a última coisa que eu preciso". Por amar tanto aceitava que fosse assim, não sem sofrer. A verdade liberta, mas mesmo livre, até então escolhera a dor à segurança, pois cria ser isso viver. Mas estava cansado, a indiferença minava-o lentamente e a dor se tornara um castigo auto-imposto, sem objetivo e que começava a produzir ressentimento. Dissera a si próprio que iria até o fim, mas não queria chegar nesse ponto. Aceitava a amargura, mas não o ressentimento. Então resolveu tomar uma decisão, a mais drástica que já tomara em toda sua vida. Há muito que a considerava, sempre com pavor e desdém. Mas agora era a única coisa a fazer, nada mais importava. Precisava acabar de uma vez por todas com aquilo tudo. Vencido, tomou a decisão que adiara por tanto tempo. Resolveu... Finalmente resolveu crescer...
O coração era um transatlântico, grande como a palavra.
Mas transatlânticos também afundam. E este está à deriva há muito tempo...